Por Mariana Nassif

O empreendedorismo materno vem, há tempos, tomando espaço no mercado brasileiro. Dados do Sebrae sinalizam que cerca de 50% dos novos micro e pequenos negócios são liderados por mulheres.

Segundo Patrícia Travassos, que liderou a série Mães S/A, veiculada em 2013 pelo Fantástico, “as mulheres estão fazendo uma segunda revolução no mercado de trabalho: a primeira foi quando deixaram de ser apenas dona de casa e começaram a trabalhar fora. Agora, deixam o trabalho para abrir seu próprio negócio”.

A afirmação, embora obtida e replicada há alguns anos, se faz presente ainda hoje: o Maternativa, grupo fechado do Facebook que se descreve como “um grupo de inteligência coletiva sobre mercado de trabalho e empreendedorismo materno”, exclusivo para mães, conta com quase 18 mil participantes na rede e recebe pelo menos um post por semana com pedidos de dicas e orientações sobre a transição do mercado formal para o empreendedorismo vindas de mães recentes que desejam estar mais próximas de suas crias.

Em busca de flexibilidade de tempo

Esse desejo, o de ser mais presente na vida dos filhos, é certamente a principal razão para que as mulheres decidam empreender. Patrícia Pellegrini, da Moje Eventos Gastronômicos, é uma dessas mulheres – abriu a empresa com a intenção de ter mais tempo e flexibilidade de horário desde o nascimento da segunda filha, há seis anos.

Hoje, entende que estes fatores podem ser uma grande ilusão, visto que empreender sozinha, como é seu caso, pede dedicação e comprometimento que muitas vezes passa do horário comercial, especialmente no mercado de eventos.

“Mas esse desejo foi muito alimentado pela força e coragem para empreender e gerar mais renda para mim e assumir o protagonismo da minha carreira. O fortalecimento das minhas habilidades, das minhas competências. Hoje trabalho muito mais do que quando era funcionária, gero muito mais renda para minha casa e me sinto mais forte como mulher, mãe e empreendedora, vivendo todos os desafios que isso implica, vencendo-os com meu esforço pessoal.”

“A sensação é que, com crianças e empresa, vai sempre faltar tempo. Mas como amo o que faço… a dificuldade existe, assim como o prazer e a diversão, estas em maior proporção”, afirma Patrícia.

A força e a coragem são fatores quase sempre citados pelas mães empreendedoras como fundamentais para dar conta da empresa e da própria função materna, bem como o aprendizado e o desenvolvimento de habilidades são apresentados como conquistas que motivam a continuidade no mercado empreendedor – um mundo, muitas vezes, desconhecido.

E é justamente aí que mora o perigo: de acordo com o Sebrae, 60% das micro e pequenas empresas fecham as portas em até dois anos após a fundação – e o principal motivo dessa enorme parcela de encerramento de atividades é a falta de planejamento.

Organize a ação

Fundamental é não viver de sonhos, mas colocar a mão na massa e a cabeça para pensar. Mas como encontrar tempo na vida real enquanto o bebê chora e as contas não param de chegar?

Não existe um passo a passo de sucesso para as mães home office e pode ser que aí resida uma beleza: explorar o desenvolvimento pessoal e ajustar os ritmos da família nesse novo contexto traz amadurecimento tanto pessoal quanto empresarial.

Amanda Chatah, da Muskinha, começou a empreender com um blog voltado para a maternagem ativa e, com o tempo, percebeu que o conteúdo que compartilhava não combinava com o que o público desejava desse tipo de canal.

Recebendo elogios sobre a decoração do quarto de sua filha mais nova, inspirado na metodologia montessoriana, onde a criança tem mais autonomia para interagir no próprio espaço, abriu a agenda para encomendas. “A loja me escolheu, eu não escolhi a loja.

Crédito: Pixabay

Este afazer chegou de repente e, no começo, terceirizava a produção. Em pouco tempo os pedidos começaram a aumentar e, então, eu e meu marido decidimos formalizar tudo e estruturar o negócio. Foi uma loucura! Leis trabalhistas, códigos de segurança, impostos… contratamos um consultor para nos ajudar nessa fase, caso contrário seria impossível a adequação ao mercado. Passamos noites sem dormir dobrado: antes por causa da filha pequena, na época por causa da empresa – vendemos carro, largamos nossos empregos, montamos uma marcenaria e, então, tememos estar indo rápido demais. Confesso que não pensamos muito, mas em algum lugar sabia que estava tomando a decisão certa. Estar mais próxima das duas meninas era um sonho e me mantive no mercado infantil,  que tanto me encanta.”

Perceber (e abraçar) a mudança

Nem sempre o projeto inicial se mantém e é importante contar com isso – vez ou outra pensamos que existe espaço no mercado mas, ao lançar o produto ou serviço, percebemos que o desejo do consumidor pende pra um lado que não exploramos, e isso pode trazer desânimo ou promover a desistência.

Nestes casos, replanejar as rotas e (por que não?) usar a intuição e as sensações que aparecem nas trocas com o mundo externo pode ser uma experiência que fortalece o real caminho a seguir.

Patrícia e Amanda são unânimes quando dão conta que procurar ajuda especializada, assim que possível, faz milagres. “Desassociar as finanças pessoais das empresariais ainda é uma meta que não cumpri, mesmo tendo um contador – o que já é um grande feito”, diz Patrícia. Já Amanda investiu num processo de coaching para pequenos negócios e, assim, conseguiu transformar desejos e sonhos em planejamento e execução.

Planejamento é magia

Ele não deve ser visto apenas como etapa no desenvolvimento do negócio, mas sim como uma tarefa a ser desenvolvida e revisada constantemente e, esteja atenta, atua em todas as áreas da empresa – não é só o financeiro que necessita de planos.

Comunicação, marketing, estoque, prospecção, expansão… tudo isso pede um planejamento consistente e adequado para quem quer se manter ativo e próspero no mercado cada vez mais disputado do afazer próprio.

Não importa que a agenda da mãe fresca seja praticamente incompatível com as postagens do Facebook e Instagram: é extremamente relevante manter um panorama macro dividido em pequenas tarefas que, mesmo atrasadas, compõe o quadro de atividades da empresa: manufatura, atendimento ao cliente, entregas, propaganda, cursos de aperfeiçoamento – tudo deve estar listado e apontado, mesmo que como desejo futuro, para não se perder na rotina.

Comece pelo básico

O próprio Sebrae disponibiliza um material completo sobre como montar um plano de negócios que, de saída, é uma excelente base para vivenciar desafios que provavelmente aparecerão com o decorrer do tempo na empresa, por menor que seja, e acaba por proporcionar o encontro do fio condutor da própria subsistência empresarial, visto que solicita a reflexão que vai desde o investimento em dinheiro à exposição da marca para o mundo. As planners, agendas multitask disponibilizadas inclusive gratuitamente em diversos sites, também são excelentes ferramentas para a organização das rotinas casadas.

“Tenho a Moje há seis anos, desde o nascimento da minha filha mais nova. É uma empresa de pequeno porte, que vem crescendo organicamente. Sou sozinha na empresa e monto equipes de acordo com os projetos que estão sendo executados no momento, um modelo bastante sustentável pra mim. Mas sinto falta de ter com quem trocar ideias e planejamentos. Sim, tenho lucro e a vida segue no azul. Minha dica para quem quer empreender é curta mas muito forte: faça o que ama. O prazer de trabalhar com o que gosta, acima de visar lucro e benefícios, é tão grande que o resto vem. Sempre vem!”, compartilha Patrícia.

Vale lembrar do respeito aos novos ritmos, tempos e dinâmicas ao inserir os afazeres na semana, respeitando seus limites e investindo em onde quer chegar com verdade e comprometimento. A frustração de não entregar nem a si própria o que planejou pode minar os planos de desenvolvimento que, em escala de adequação, se reordena em algumas semanas ou meses. O sucesso do empreendimento materno, afinal, envolve tanto a prosperidade do negócio quanto a satisfação em realmente estar presente como mãe.